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O populismo é uma praga em qualquer sistema econômico, político e cultural. Como é um modo de governar repleto de falhas, ineficiente e enganador; precisa sempre nomear inimigos para encobrir sua perversidade e para fomentar a luta de classes mesmo onde essa luta nem é tão importante assim.
Um dos pontos mais fortes de nosso país sempre foi a cultura miscigenada e rica. Como uma enorme esponja verde e amarela, nosso país envolveu e absorveu o que de melhor havia em várias culturas que chegaram por aqui.
Das manifestações mais simplórias até as mais sofisticadas, o Brasil sempre encontrou um lugar ao sol para todas as manifestações culturais e acabou se transformando na Meca da mistura cultural mundial e lar de uma criatividade calcada na necessidade de sobrepujar as dificuldades do dia a dia.
Tudo isso se deveu a capacidade do país gerar gênios aptos a beber dessas fontes variadas e criar coisas novas e revolucionárias apenas com um olhar, um gesto ou mesmo um simples pensamento. A produção cultural brasileira sempre foi muito bem sem o apoio do Estado – durante a ditadura – e, principalmente, sem a ingerência do populismo.
Mas, nos últimos dez anos, experimentamos uma revolução populista sem igual e a utilização da cultura como forma de doutrinação e tomada de poder por parte de políticos oportunistas, sujos e sem nenhuma intenção de fazer o bem.
Assim, se cria em nosso país, a inacreditável ideia da luta de classes cultural. Para os organismos políticos que devem gerir a cultura hoje fica claramente estabelecido que há a cultura “para o pobre” e a cultura “para o rico”.
Tal ideia se materializa nas palavras do ex-presidente Lula ao chamar de “Besta” um menino carente do Rio de Janeiro que era auxiliado por uma ONG de tenistas. Em um vídeo famoso, espalhado pela Internet, Lula diz – ao saber que o menino pobre aprende a jogar tênis como parte do trabalho da ONG – “Deixa de ser Besta, tênis é pra burguês. Tem que jogar futebol”.
Ou seja, para o populista, é necessário fomentar a luta de classes para que haja um inimigo a ser combatido e desvie a atenção do povo de sua ineficiência, de suas mazelas e da sua corrupção. Para eles, o pobre – para ser “digno” de receber essa alcunha deve dedicar-se culturalmente apenas ao samba, ao futebol, a percussão, ao funk ou a outras atividades culturais “populares”.
Se, por acaso, o “pobre” desejar aprender tênis; golfe; pólo; gostar de música clássica; aprender balé clássico ou outras atividades “da elite”, deixa de ser “puro” e passa a ser “um besta”. Tudo isso é aplicado em discursos bem elaborados, recheados de sorrisos e de apertos de mão. Enquanto isso reduzem as escolas públicas à “pó de traque” e as transformam em máquinas de emburrecer. Publicam livros didáticos em que “nós vai, a gente vamos” e “10 – 7= 4” são verdades aceitáveis; professores e profissionais da educação vagam pelas cidades brasileiras como pedintes maltrapilhos. Nossa sociedade volta-se para a mediocridade cultural e se acorrenta firmemente nos grilhões da ignorância como se isso fosse o seu maior legado.
Assim, apagam-se os grandes mestres, ocultam-se os grandes livros, queima-se a memória dos gênios que revolucionaram a nossa cultura ou simplesmente abre-se mão de nossa história cultural em favor de nações estrangeiras que a valorizam muito mais do que os populistas que nos assaltam.
Você, leitor do Visão Panorâmica, deve estar se perguntando o porque disso tudo. Mas, assim que tudo for revelado nas próximas linhas, tenho certeza de que você se sentirá tão indignado e tão roubado quanto eu.
No ano de 2009 perdemos um dos maiores expoentes de nossa cultura. Uma figura querida no mundo do teatro; premiado e reconhecido internacionalmente como um revolucionário e um verdadeiro visionário em sua área.
Falo do criador do Teatro do Oprimido – Augusto Boal.
Carioca; Augusto Boal era um dos grandes diretores e dramaturgos do planeta. Mundialmente reconhecido; foi nomeado embaixador da UNESCO e usou o teatro como forma de expressão política e ação social na luta contra a ditadura militar. Num país com milhões de analfabetos, Boal trouxe a possibilidade dessas pessoas se expressarem num mundo em que jamais teriam voz. Foi torturado e exilado durante a ditadura e voltou a aplicar sua técnica no Brasil após a anistia. Dizia sempre: “Vemos o mundo além das aparências, vemos opressores e oprimidos em todas as sociedades, etnias, gêneros, classes e castas, vemos o mundo injusto e cruel. Temos a obrigação de inventar outro mundo porque sabemos que outro mundo é possível. Mas cabe a nós construí-lo com nossas mãos entrando em cena, no palco e na vida”.
Agora, chega a notícia de que todo o acervo cultural e documental de Augusto Boal embarcará para a Universidade de Nova York (New York University – NYU); ficando sob sua tutela definitivamente – para o deleite de pesquisadores e alunos americanos. Tudo porque o Ministério da Educação e Cultura (esse nome é uma piada) ou nenhuma outra entidade governamental ligada à cultura quis “gastar” com a manutenção, digitalização e preservação do acervo.
A coisa fica ainda mais ridícula e triste quando levamos em consideração que o valor total necessário para preservar o material era de quinhentos mil dólares – menos de um milhão de reais.
A universidade vai enviar especialistas que levarão embora todas as preciosidades criadas pelo homem que teve a obra traduzida em mais de setenta idiomas e foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 2008. Fitas K7, DVD’s, VHS serão tratados com tecnologia da NASA que garante a sobrevida de 500 anos ao material. Também será criada uma sala especial que receberá a parte documental de sua obra e poderá ser visitada, gratuitamente. Também será criado um portal, em três idiomas, na Internet como forma de garantir o acesso total da obra por pesquisadores e interessados.
Enquanto isso, nós, ficamos aqui batendo lata; jogando futebol; cantando funk e achando que pobre não pode ter acesso à cultura para não ficar “besta”.
Pense nisso.
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