Muito antes das tais “mulheres-frutas”, leia-se mulher-melancia, mulher-melão, mulher-moranguinho, estarem em voga, deparei-me em um boteco sujo com a mulher-maracujá. Resumindo, era uma velha feia de cabelos loiros e surrados, pele bastante enrugada, daquelas que os bebuns deparam-se e dizem: “essa é feia, heim..essa sempre foi feia”. Aliás, a alcunha havia sido sugerida por um bêbado, que um dia apontou para seu rosto e disse: “você tem cara de maracujá atropelado, nem com conhaque vagabundo você desce”. Mas a tal mulher maracujá parecia ser uma pessoa introspectiva, não se importando com tais dizeres, pois estava tão calejada pela vida que havia se tornado imune a qualquer comentário depreciativo. Bastava para ela alguns copos de conhaque presidente e, de vez em quando, a pica de algum bêbado que tomasse coragem de comê-la ou, ainda, receber da velha uma chupeta em alguma rua escura nas proximidades. Waltinho, um deficiente físico, era outro freqüentador assíduo daquele botequim. Era um desses sujeitos também calejados pela vida, desses que passaram a vida sendo estigmatizados por apresentar deficiência, no caso dele, nas pernas, as quais eram tortas e dificultavam seu caminhar. Waltinho aportava toda noite naquele bar na intenção de beber e pegar qualquer mulher, independente do peso, idade ou aparência, a tática era sempre a de pagar algumas bebidas a alguma criatura que estivesse suscetível, ou seja, dura e na sede por alguns goles. Nessa noite, sem outra opção, Waltinho sentou-se no balcão, ao lado da mulher-maracujá. Entabulou conversa. A mulher-maracujá, naquela noite, estava mais deprimida do que o seu normal e com um ar fadigado, após cinco minutos de diálogo, foi logo ao assunto: “chupo você lá fora se me pagar uma garrafa de conhaque presidente”. Ele pediu a garrafa e a viu bebê-la por completo, a cada talagada ela fazia uma careta, torcia o nariz e mostrava os dentes estragados. Após o último gole, quando ambos já eram os últimos clientes e a porta do bar já estava abaixada, saíram a procura de algum canto escuro. Alguns metros dali, a velha parou, agachou-se, desabotoou o zíper da calça de Waltinho e começou a chupar seu pau ainda mole. Segurando o pau de Waltinho, que ainda estava longe de uma ereção, ela gargalhou e disse: “sabe, você não desce nem com conhaque presidente”. E continuou a gargalhar. Waltinho, então, desferiu um tapa na cara da velha, que caiu deitada sobre o chão, porém ela, que continuava gargalhando, pôs-se de pé e novamente disparou, “nem com conhaque presidente, seu aleijado”, cuspindo e gargalhando ainda mais, até que Waltinho, reuniu todas suas forças e desferiu outro tapa na cara da velha, que desta vez desmaiou, talvez mais devido ao seu estado de embriaguez que propriamente pelo tapa, caindo sobre o chão, parte do corpo sobre a calçada, parte sobre o asfalto da via. Parecia morta. Waltinho fechou a braguilha e saiu caminhando vagarosamente até desaparecer na escuridão. Exatamente na noite seguinte, ambos estavam novamente no mesmo balcão, diante de seus copos, mergulhados em seus próprios mundos, como se nada houvesse acontecido na noite anterior, como se suas vidas recomeçassem a cada noite, ou seja, com Waltinho procurando por alguma baranga suscetível de trocar seus préstimos por uns goles de bebida barata, bem como pela mulher-maracujá, esta que enquanto embriagava-se aguardava pelo eventual aparecimento de algum bebum que quisesse comê-la ou, ainda, por qualquer meio-conhecida que se submetesse a emprestar seus ouvidos e ouvir a velha despejar um caminhão de lamentações até o encerrar-se de mais uma noite com o rosto apoiado na privada ou o com o corpo prostrado na sarjeta. Essa é a mulher-maracujá, ou “era”, talvez.
Nosferato
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