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Revista EXAME -
De qualquer ponto de Copacabana, a mais turística das praias cariocas, vê-se o prédio de 38 andares que abrigou, por três décadas, o hotel Le Méridien. O edifício tornou-se um símbolo do Rio de Janeiro ao inaugurar a queima de fogos do Réveillon, na década de 80. Nos últimos dois anos, o cartão-postal havia se transformado numa espécie de hotel fantasma, enquanto a Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, tentava encontrar um candidato a ocupá-lo, como dono ou inquilino. Essa história agora está perto do fim e o novo dono do prédio deve ser o espanhol José Oreiro Campos, que chegou à disputa como azarão. Oreiro é dono da rede de hotéis Windsor, a maior da cidade. Até o fechamento desta edição, os advogados de ambas as partes acertavam os detalhes finais do contrato, mas as condições do negócio já estão fechadas. Para adquirir o novo hotel, Oreiro deve desembolsar mais de 160 milhões de reais, pagos em parcelas. Outros 50 milhões, no mínimo, devem ser gastos para reformá-lo.
Para a Previ, a venda é um alívio, não pelo valor, ínfimo perto dos negócios do fundo, e sim por encerrar um imbróglio que remonta a agosto de 2007, quando o hotel, operado pela rede espanhola Iberostar, foi fechado para obras que nunca chegaram a acontecer. Mas, para Oreiro, um galego recluso de trajetória tão bem-sucedida quanto controversa, o negócio representa o grande salto. O dono do Windsor chegou ao Rio ainda adolescente para trabalhar como garçom e construiu uma rede de negócios variados, com restaurantes, hotéis, boate e até concessionária de veículos. Estima-se que só a rede Windsor, o coração do grupo, com nove unidades e mais de 2 000 quartos e 1 650 funcionários, fature pouco mais de 100 milhões de reais (a empresa não divulga seus números). Com a compra do Le Méridien, Oreiro fará o maior negócio de sua vida, comprometendo no empreendimento o equivalente a dois anos de receitas da Windsor. Acrescentará, numa única tacada, 500 quartos à rede. E, de quebra, vai dificultar a vida da concorrência. "Ele acabou com uma das últimas possibilidades de entrada de um novo concorrente no Rio", diz Ernesto Marino, presidente da consultoria BSH International. "É uma grande jogada." Até o início do ano, a Previ negociava também com as redes internacionais Marriott e Starwoods, que, com a crise global, desistiram do negócio.
Oreiro faz parte de um grupo de imigrantes espanhóis originários da Galícia que chegaram ao Rio na década de 50, com a ambição de fazer fortuna. Com pouca instrução, começaram a trabalhar como garçons e copeiros e, aos poucos, foram se associando para formar pequenos negócios. Nos anos 80, os galegos do Rio já eram donos de boa parte de restaurantes e casas noturnas. Pertenciam a esse grupo Francisco Recarey, que ficou conhecido como o "rei da noite" carioca, e Pedro Gonzalez, dono do Bateau Mouche, que naufragou no Réveillon de 1988 para 1989, deixando 55 mortos. Recarey e Gonzalez sofreram pesados processos por sonegação de impostos nos anos 90. Foi com Recarey que Oreiro montou os primeiros restaurantes, adquiriu a boate Help e fez a poupança que permitiu que ele comprasse o primeiro hotel, em 1986. Até passar a se concentrar em hotéis, Oreiro foi também dono de um dos maiores bingos do Rio, o Arpoador. Mas, diferentemente dos conterrâneos, seu instinto de sobrevivência o ajudou a escapar de escândalos. Distanciou-se de Recarey enquanto o sócio era atingido por uma avalanche de denúncias e deixou de ser sócio do bingo dois anos antes das investigações que levaram à CPI dos Bingos. De uma complicação, no entanto, Oreiro não se livrou. Em 2006, foi acusado pela Polícia Federal num inquérito que apurou evasão de divisas e lavagem de dinheiro via contas do extinto Banestado. Procurado, Oreiro não quis dar entrevista.
Os antigos rolos do espanhol, porém, não foram empecilho para a compra do prédio da Previ. "Até onde sabemos, quem já fez negócio com ele não teve do que se queixar", diz um executivo ligado ao fundo de pensão. O maior problema para Oreiro foi o interesse da Vale em transferir para o prédio do Le Méridien a sua sede. A mineradora cobriu as ofertas de nove concorrentes, mas desistiu em março, quando a prefeitura anunciou que, devido a um decreto municipal, só hotéis podem funcionar no prédio. Para continuar na disputa, a Windsor precisou aumentar sua proposta, e só passou a ser considerada uma candidata viável depois que a Vale, saiu do páreo. Apenas em abril Oreiro conseguiu da Previ uma declaração de exclusividade na negociação. Segundo estimativas de consultores e empresários do setor, serão necessários pelo menos mais quatro meses para que o prédio possa voltar a receber hóspedes. Para um ex-garçom, isso não é nada, comparado ao feito de colocar o logotipo de sua rede no maior arranha-céu de Copacabana.