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Não entendeu o final de Lost? Provavelmente porque você ficou esperando respostas didáticas como num livro do professor com as soluções dos problemas escritas em vermelho logo abaixo da pergunta. Desculpa, mas esse tempo já passou, então é hora de pensar só um pouquinho. Nem tanto assim, mas só um esforço da massa cinzenta.
Antes de mais nada, tenha em sua cabeça o seguinte mantra: é uma série de ficção. É a cabeça do autor pensando no que será, foi e é. É a vontade dele. Goste você ou não.
Agora esqueça todas as teorias que você ouviu, leu e pensou. É isso aqui embaixo e pronto. Não tem outra coisa. E saiba que esse texto não é de um fanático. Eu não passei seis anos perguntando o que ou como seria. Apenas encarei como um programa de televisão e só.
Eram muitas perguntas: o que eram os números, o que era a ilha, quem eram os hippies, os ursos polares, as visões, as viagens no tempo, Jacob, Richard, flashsforwards e flashbacks, monstro de fumaça, Widmore, Desmond, estavam vivos ou mortos…. Com exceção da última questão, todas foram respondidas ao longo da série. Claro que a maioria só se resolveu no final, ou perto disso, mas se você olhar a série com um pouco mais de cuidado, verá que tudo foi explicado. Não espere, no entanto, que alguém apareça e diga “amiguinhos, agora eu vou explicar os números, tá? Peguem seus cadernos e abram o livo Lost na página 25″. Reveja os DVDs com mais atenção e menos sono.
Como tudo foi respondido ou subentendido, vamos ao final. O que foi o final?
Pegue a última temporada. Ela é composta de uma história na ilha e uma história paralela, certo? Não! Em primeiro lugar, separe as duas. Elas NÃO são paralelas. Como se fossem dois CDs, coloque a saga da ilha em uma mídia e a vida em terra firme em outra. Assista primeiro a história da ilha. Ela é a conclusão de Lost. Quando Jack fecha os olhos, a história de Lost acaba. Tudo aquilo (avião, os outros, números, viagens no tempo, vai e volta….) aconteceu. Tudo. Nada foi sonho, ninguém estava morto, não era uma fenda no tempo, nada disso. Tudo aconteceu como numa boa série de ficção científica, mas sem naves, aliens e outras palhaçadas.
Quando Jack morre no final, aí sim começa a segunda parte. Na verdade, ela começa quando o avião atravessa a turbulência na série paralela e cada um segue sua “vida”. Aí você vai dizer que não faz sentido por causa do tempo das ações entre uma coisa e outra. Eu te lembro que não são histórias paralelas. Para ajudar a entender, você viu “O Sexto Sentido”? Se não viu, pare de ler agora. Eu vou contar o final.
No filme, Malcolm Crowe (personagem de Bruce Willis) cuida de um garoto que vê gente morta, mas que ainda não embarcou para o outro caminho. Lá pelas tantas ele percebe que faz parte desse grupo e que já havia morrido há tempos, só que possuía uma missão antes de ir para a luz. Com Lost foi parecido.
Torno a lembrar que as histórias não eram paralelas, não tire isso de sua cabeça.
A vida quando o avião pousa não é mais vida. Já estão mortos ali, mas durante a passagem da Terra para esse purgatório, eles se desprenderam e esqueceram quem era cada um. Foram lembrando das coisas ao se tocarem em determinados momentos. O único que sabia disso era Desmond, que passou por um experimento de Widmore e entendeu tudo o que se passava. Aí você vai dizer “ah, mas o experimento não mostrou isso!”. É, Star Wars também não apresentou o pai de Anakin e ele nasceu. Amigo, o autor quis assim e pronto. Se tiver que esmiuçar tudo, mostrar tudo, a série não acaba nunca. Voltando…
Nesse purgatório, os personagens mais importantes foram se encontrando e como não tinham memória (lembrem-se: estavam mortos), ninguém estranhou a vida nova como Jack ter um filho, Sawyer ser policial, Benjamin dando aulas e por aí vai. Não era o mundo, era uma área de passagem onde nossa lógica já não fazia mais sentido. E nesses 18 episódios finais, pudemos ver a caminhada de todos os que morreram em determinado momento da série, mas que possuíam um motivo para estar na ilha. Os tais candidatos. Mais gente estava no Oceanic 815, mas eram irrelevantes para o fim da série. Porém, alguns deles apareceram mesmo assim, como Ana Lucia e Libby. Se não me engano, apenas Walt, Michael e Mr. Eko não figuraram nesse post mortem.
Quando Jack encontra seu pai na igreja, ele finalmente tem o seu momento “O Sexto Sentido” e cai na real. Os outros foram tendo à medida que se encontravam e suas reações eram as melhores. Alguns entenderam antes, como Kate, Hurley, Locke e Boone. Os demais, só no final mesmo. Então estando todos reunidos, puderam fazer a passagem de uma vez. E lógico que como estamos falando de um purgatório, nem todos morreram ao mesmo tempo.
Lapidus, Alpert, Kate, Sawyer e Miles sairam da ilha, mas eventualmente morreram no futuro. Não precisa apontar quando exatamente, pois como dito pelo pai de Jack, “todo mundo morre um dia”. E nesse dia eles se encontrariam. O mesmo para Rose e Bernard. E Vincent, o melhor personagem de toda a série e que, segundo os produtores, seria o único a não morrer no final.
Hurley e Benjamin merecem um destaque. O gordão virou o novo Jacob, então deixou de ser humano. Jacob não era uma pessoa, mas uma entidade. Podia ser morto? Em termos. O que é a morte? Quem garante que Jacob não passava simplesmente para um outro lado e deixava as coisas correrem por aqui? Quer um exemplo? Os Jedis.
Os autores da série são fãs confessos de Star Wars, e todo mundo sabe que os Jedis não morrem como as pessoas normais. Não to dizendo que Jacob é um Jedi, peloamordedeus, mas que não morre na concepção do verbo “falecer”. Hurley agora é outro. Aquele Hurley que estava na igreja era a versão desencarnada do gordo que ficou na ilha. Tal como o próprio Jacob, ele sai desse mundo material nosso e se permite outras coisas. Até morrer, quando achar necessário.
Benjamin, por outro lado, virou um novo Richard e sua hora chegaria depois. Não entrou na igreja porque não era para ele estar ali. Vai morrer e ir para outro lugar quando for a sua vez. Simples assim. Enquanto isso, ele vai cuidando de Vincent na ilha.
Lost não usou um final “a verdade está lá fora”. Usou o final que podia usar. Se você ficou esperando que cada coisinha fosse respondida detalhadamente, entendo sua frustração, mas se fizesse isso, Lost teria fugido de suas características.
Encare como um programa de TV. Só isso. Ele chegou ao seu fim e os pequenos detalhes que nada influenciavam (mas davam o charme) serão explicados em extras nos DVDs, palestras, fóruns e sei lá mais o que. Estamos diante de um novo Star Trek. Bom, eu não. Acabou a série, acabou pra mim. Vou tocar minha vida.
E depois de tudo isso, faço um flashback lá pro segundo parágrafo e peço que tenha em sua cabeça o seguinte mantra: é uma série de ficção. É a cabeça do autor pensando no que será, foi e é. É a vontade dele. Goste você ou não. E o que acabou foi só um programa de televisão. Nada mais do que isso.
Tá entendido? Ou precisa de um PPT?