Amigos, ganhamos as duas últimas copas sofrendo.
A única certeza que fica, aliás, é essa: ganhando ou perdendo, será sofrível. As nossas últimas vitórias, foram assim, sofridas e eivadas pela incerteza. E vieram acompanhadas de um brinde incômodo: aquele da vitória que engana.
Ganhamos, mas não convencemos ninguém. O último time brasileiro que nos sufocava de orgulho não ganhou a Copa. Já tem vinte anos que jogamos dentro de uma média mundial.
Podemos dizer que o futebol arte morreu com Telê Santana, Zico, Sócrates e Falcão, os últimos representantes dignos da escola que criamos (ou ajudamos a criar) , a do dito futebol arte. O futebol arte não morreu. Está , digamos, adormecido, e , de vez em quando, dá uma voltinhas rápidas pelos campos, nos jogos da Espanha e do Barcelona.
Depois deles, tivemos momentos esparsos de brilho às custas de uma individualidade ou outra. Romário, Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho. Infelizmente pra eles ( e pra nós) , jogaram no ataque, mas não tiveram grandes meias para assessorá-los. Tínhamos bons volantes, zagueiros e laterais, mas meia que é bom, nada. Mesmo Ronaldinho Gaúcho jogando mais recuado, não tinha, a meu ver, a armação do jogo como grande qualidade. Sempre gostou de usar a 10, mas por conta de seu talento, de seus dribles, seus chutes e suas arrancadas.
Essa é a diferença do que fomos e do que somos . O futebol brasileiro se tornou acéfalo. Como já foi dito aqui e também em muitos outros lugares, perdemos aquilo que sempre nos marcou: a criatividade. O futebol brasileiro se tornou um conjunto tático engessado, com um ótimo preparo físico, tendo, no máximo, um ou outro atacante à altura de sua história.
A atual geração, com a honrosa exceção do Neymar, nem isso tem. Pior que isso: estamos ainda distantes mesmo da excelência tática. Isso o Mano pode até trazer até a Copa, mas não será o suficiente para que o sofrimento desapareça. Podemos até ganhar, mas será na base do sufoco, porque não temos mais um grande futebol. Continuamos acéfalos.
"Me dê um Zico que eu o escalo agora mesmo", disse certa vez, o Parreira, com sua fleuma habitual, durante as entrevistas em que era torturado pelos jornalistas cretinos daquela época, no já distante período de 91 a 94.
Pois é. Em 94, tinha o bordão" Tira o Dunga!!" Jogávamos pro gasto. O meio de campo era reveldor: Mauro Silva, Mazinho, Zinho e Dunga... Raí não pediu pra sair, como a torcida bradava, mas foi sacado sem mais delongas pelo treinador. O time sofreu pra ganhar quase todos os jogos até a final, com direito ao golpe de MMA do Leonardo no Tab Ramos...
O nosso diferencial era a qualidade de Romário e Bebeto no ataque.
Em 2002, trocamos técnico, passamos vergonha nas olimpíadas, na reta final ficou aquela polêmica sobre a presença ou não do Romário. O time tinha até o diferencial na frente, com os três R's, mas faltava uma estrutura que os possibilitasse jogar. Felipão encontrou a solução a tempo, felizmente. Armou um ferrolho defensivo e soltou os cobrões. Deu certo, mas sofremos muito ainda assim, com direito a gol de bico do Ronaldo contra a Turquia, arbitragem nebulosa contra a Bélgica...
Hoje temos Damião, Pato, jogadores comuns e desprovidos de carisma e personalidade, qualidades que sobravam em caras como Dunga e Branco, por exemplo. E a culpa dessa deficiência, pelo visto, é do treinador e não o de toda uma conjuntura que já remonta há quase duas décadas...
Enquanto a abstinência de meias talentosos como Zico, Sócrates, Rivellino, Jair da Rosa Pinto, Didi, Zizinho continuar, estaremos fadados ao sofrimento. Nossos atacantes continuam muito bons, mas muito longes do que eram caras como Pelé, Garrincha, Amarildo, Jairzinho e tantos outros.
Esse é o prato do dia: sofrimento, sem acompanhamento nenhum.
Tratemos de engoli-lo.