A Crise Econômica Mundial
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Re: A Crise Econômica Mundial
Prêmio Nobel de Economia diz que risco de colapso do euro não acabou, mas está menor
Deborah Berlinck
PARIS - Michael Spence, prêmio Nobel de Economia de 2001, saudou o acordo para salvar a zona do euro como ótima notícia. Mas alerta: o risco de colapso do euro e de um contágio atingir o mundo emergente não acabou. "Agora, o desafio é implementar o acordo", disse em entrevista ao GLOBO em Paris. Como muitos economistas, ele acha que a Europa precisa criar rapidamente "autoridade central" com poder para agir, sobretudo nas áreas de finanças e fiscal. Às vésperas da reunião do G-20 - grupo que reúne países emergentes e ricos - Spence diz que o bloco perdeu fôlego e precisa se concentrar para buscar soluções para uma questão central: crescimento. Quanto ao Brasil, Spence só tem elogios: "o país está indo bem!", avalia.
GLOBO - Os bancos europeus concordaram com uma acordo de redução de 50% da dívida grega. O risco de colapso do euro acabou?
SPENCE - Não acabou, mas se reduziu substancialmente. Agora o desafio é fazer, é implementar. A recapitalização dos bancos é complexa, e envolve capital privado, do governo e regional, com o Fundo de Estabilidade Europeu por trás.
Se isso for resolvido, o que falta fazer?
SPENCE - Itália e Espanha têm que fazer várias reformas para ter o apoio da União Europeia, especialmente do Banco Central Europeu (BCE). Eles não podem estabilizar sua condição fiscal imediatamente. Pode haver ainda surtos de contágio, levando a um aumento das taxas de risco, e eles precisarão do BCE para comprar sua dívida soberana e fazer a taxas diminuírem.
O que eles não devem fazer?
SPENCE - O que não devem fazer agora é não fazer nada. Seria o pior. Tanto os mercados ou o BCE vão ficar nervosos. Os programas de reforma têm que ser credíveis. A Itália foi bem no controle do déficit, mas não tem um programa credível de reforma orientado para o crescimento econômico.
O contágio, então, para outros países do euro não está excluído?
SPENCE- Ainda não. Mas se programas de reformas foram lançados e se o Banco Central Europeu for entusiasta em relação a eles, o risco diminui.
Esta crise mostrou falhas na construção da Europa, que não consegue falar com uma só voz ou só reage em caso de urgência. Como o senhor vê isso?
SPENCE- A introdução do euro foi um passo perigoso. Funcionou por um tempo, porque as taxas de juros eram estáveis e baixas. Infelizmente, isso levou países a buscarem o crescimento através do endividamento dos governos. Não foi uma boa idéia. Não vejo problema com um bloco formado por estados culturalmente diversos. Mas estes estados têm que ser unificados na área fiscal, com uma autoridade para taxação, outra para emissão de bônus, e tem uma autoridade central, eleita, com capacidade para agir. O que não pode continuar é, cada vez que há uma crise, ter que ter 17 países para concordar.
Eles têm que mudar o poder de decisão na UE, por exemplo, aprovando medidas por voto majoritário em vez de por unanimidade, é isso?
SPENCE - Isso. No meio tempo, isso pode funcionar. Mas será preciso ter um ministro das Finanças da UE, e um Banco Central Europeu e uma autoridade central que tenha, pelo menos, algum poder. No federalismo, você pode ter países guardando ainda uma boa dose de autoridade, mas não completamente independentes em áreas como a fiscal.
Brasil e China ofereceram ajuda para os países europeus em crise. É uma grande mudança, não?
SPENCE - É uma grande mudança, de fato. Trata-se de países que, há 10 ou 15 anos, não tinham condições em material de recursos. Mas acho que Brasil e China estão querendo ajudar num contexto multilateral. Não querem ajudar por conta própria. Acho que esta ajuda, com a autorização da UE, poderia ser administrada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
O Brasil teme um contágio da crise europeu no mundo emergente. Este risco existe?
SPENCE - Claro. Os canais de transmissão são claros: Se a Europa tiver uma crise financeira que provoque uma recessão na economia real, isso vai puxar a economia americana para baixo, porque somos grandes parceiros comerciais. E com queda nos principais países avançados, isso vai, pelo menos, provocar uma desaceleração nos países emergentes como Brasil e Índia. Não sairão destruídos com isso, mas têm muito em risco.
O senhor parece mais otimista hoje, não ?
SPENCE- Estou mais otimista agora do que estava ontem. O acordo é um grande passo. Antes (do acordo) se tivesse me perguntado quais as chances de uma recessão nos países avançados provocar uma grande desaceleração na economia global, eu responderia: 50%. Agora, a probabilidade bastante, caiu para 15%. Mas se algo sair errado na implementação (do acordo europeu) ou no mercado imobiliário americano.e os consumidores pararem de consumir. Enfim, as coisas ainda podem dar errado.
O senhor e muitos economistas estão dizendo que austeridade, no momento, é a receita errada. Por que muitos governos europeus insistem nisso, então ?
SPENCE - Eles não entendem. E eu não entendo (eles). Não pode resolver um problema fiscal sem crescimento. É impossível! Veja o caso da Itália: tem problemas estruturais e de crescimento e muito jovens desempregados. Tem que consertar isso. Mas ao mesmo tempo tem uma dívida em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) de 120% e eles não têm que ser ajudados. Não devem. O déficit da Itália só vai cair com crescimento.
Como reduzir dívida e crescer ao mesmo tempo? Não é cortando despesa?
SPENCE - Não é preciso ter déficits tão grandes quanto o da Itália para crescer. O que precisa é reforma do mercado de trabalho, por exemplo. A discussão agora nos Estados Unidos é se não deveríamos reduzir muito rápido o deficit. Mas muitos de nós, economistas, dizemos: o déficit tem que baixar, mas se isso for feito muito rapidamente, a demanda vai cair tanto que será mais difícil recuperar. A questão é: quão rápido devem-se reduzir os déficits, trazendo o déficit para 70% ou 80% do PIB, mas crescendo o bastante para reduzir ainda mais o déficit.
Por que dizem quem o G20 está adotando uma abordagem de curto prazo ?
SPENCE- O problema é com esta rotatividade de presidentes. Cada país que assume a presidência do G20 estabelece suas prioridades. É preciso que haja continuidade e que alguns temas principais permaneçam na agenda de um encontro à outro, como emprego e talvez meio ambiente.
Quais são os principais desafios da reunião do G20 na semana que vem ?
SPENCE - O G20 atuou bem na crise, sobretudo em 2008 e em abril de 2009. Mas depois que a crise foi sendo debelada, o G20 parou de agir. Eles queriam fazer algo interessante sobre recuperação da demanda global, mas acabaram numa discussão sobre guerra cambial e coisas do tipo. Ok, mas eles acabam se desviando. Os chineses costumam dizer: não se deve discutir primeiro coisas em que há grandes divergências, mas sim onde há alinhamentos de interesses. Eles estão certos.
Qual o tema que os países deveriam se concentrar nesta reunião, então?
SPENCE - Eu diria crescimento: um leque de políticas de crescimento para a Europa, Estados Unidos e na China, para complementar.
Como o senhor avalia a economia brasileira hoje ?
SPENCE - O Brasil está indo bem. A atual confusão sobre desaceleração no crescimento está doendo um pouco. Mas em geral, o Brasil está bem governado em termos macroeconômicos, construiu vários programas para trazer ex-marginalizados para a economia moderna, através de educação e distribuição de renda. Tudo está indo na direção certa, inclusive a distribuição de renda.
Um problema que preocupa é inflação.
SPENCE - Inflação é um problema, mas o Brasil é mais agressivo (no combate) do que outros países. Eu não acho que inflação vai se descontrolar no Brasil, até porque vocês tiveram uma experiência tão ruim com inflação no passado. Às vezes o Brasil é até agressivo demais no combate.
http://oglobo.globo.com/economia/mat/20 ... 676528.asp
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Re: A Crise Econômica Mundial
Essas medidas da semana passada não resolvem nada, pelo contrário.
Um calote negociado de 50% da dívida grega não é algo que possa ser estendido para países como Espanha e Itália, só a Itália tem mais de $ 2,6 trilhões em dívidas. Se defaultasse em 50% também, o tal Fundo Europeu que se pretende alavancar para atingir $ 1 trilhão não daria para recapitalizar os bancos que levassem o calote italiano. A Espanha é ainda pior, com um desemprego de 21%.
Só trouxas estão comprando ações de bancos europeus, parte é porque estavam vendidos e tiveram de cobrir posições, mas logo esse movimento acaba e as ações de bancos vão sobrar na mão de uns desavisados.
Um calote negociado de 50% da dívida grega não é algo que possa ser estendido para países como Espanha e Itália, só a Itália tem mais de $ 2,6 trilhões em dívidas. Se defaultasse em 50% também, o tal Fundo Europeu que se pretende alavancar para atingir $ 1 trilhão não daria para recapitalizar os bancos que levassem o calote italiano. A Espanha é ainda pior, com um desemprego de 21%.
Só trouxas estão comprando ações de bancos europeus, parte é porque estavam vendidos e tiveram de cobrir posições, mas logo esse movimento acaba e as ações de bancos vão sobrar na mão de uns desavisados.
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Re: A Crise Econômica Mundial
As medidas, se implementadas, resolvem o problema específico da Grécia... Serviram para evitar que um país do bloco desse um calote unilateral, o que imediatamente levaria à disparada dos juros dos outros países problemáticos, especialmente Espanha e Itália.Hammermart escreveu:Essas medidas da semana passada não resolvem nada, pelo contrário.
Um calote negociado de 50% da dívida grega não é algo que possa ser estendido para países como Espanha e Itália, só a Itália tem mais de $ 2,6 trilhões em dívidas. Se defaultasse em 50% também, o tal Fundo Europeu que se pretende alavancar para atingir $ 1 trilhão não daria para recapitalizar os bancos que levassem o calote italiano. A Espanha é ainda pior, com um desemprego de 21%.
Só trouxas estão comprando ações de bancos europeus, parte é porque estavam vendidos e tiveram de cobrir posições, mas logo esse movimento acaba e as ações de bancos vão sobrar na mão de uns desavisados.
O Fundo de Estabilização não tem o objetivo de compensar calotes de Espanha e Itália, mas evitar que eles aconteçam, mantendo seus juros baixos. Nenhum outro país vive uma situação catastrófica como a Grécia, o que pode ocorrer é os juros subirem a ponto de suas dívidas se tornarem insustentáveis. O Fundo vai negociar títulos desses países para evitar isso. Se vai dar certo, não sei...
Mas com o problema da Grécia resolvido, a probabilidade de dar errado é menor.
Agora, o problema da Europa vai demorar pra ser resolvido e passa por uma união fiscal (o que significa que os países terão de abrir mão de parte de sua autonomia orçamentária) e pela redução dos desquilíbrios de produtividade entre o norte (a Alemanha) e o sul (o resto). Reduzir esse desequilíbrio significa basicamente reduzir o salário dos trabalhadores do sul (ou acabar com o euro e permitir que os países controlem suas taxas de câmbio). Tudo isso vai demorar muito e, até lá, os europeus vão capengar mesmo...
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Re: A Crise Econômica Mundial
Depois de um trilhão de dólares
Antonio Delfim Netto
A crise que o mundo está vivendo tem aspectos paradoxais. Presta-se a múltiplas interpretações, cada uma delas colocando, segundo o viés ideológico do analista, seu foco sobre os diferentes aspectos em que ela se revela. Os economistas do "mainstream" estão na defensiva por terem demonstrado "matematicamente" (e até conseguido prêmios Nobel) que os mercados (em particular o financeiro) eram eficientes e autoadministráveis. Dispensavam, portanto, a "mão visível" do governo.
Os economistas com viés marxista não deram um passo além da constatação do velho Karl: os mercados financeiros são essencialmente instáveis. Pela centésima vez proclamam o rápido fim do capitalismo, como se ele fosse uma coisa e não um processo histórico com as "contradições" que o dinamizam e o civilizam lentamente pelo sufrágio universal.
Os economistas com viés keynesiano hidráulico (incorporado ao "mainstream") assistiram ao irremediável fracasso dos seus "multiplicadores". Mecanizaram as sofisticadas considerações psicológicas do papel das expectativas e a inevitabilidade da incerteza sobre o futuro opaco. Essas continuaram a ser cultivadas apenas por um pequeno grupo, expulso da profissão como "heterodoxo".
Os economistas do "mainstream" foram, no máximo, apenas coadjuvantes da crise. Quatro anos depois de instalada, é evidente que sua "causa eficiente" foi a rendição dos governos à pressão econômica do único poder universal emergente: os mercados financeiros! Apenas teorizaram "a posteriori" a luta entre o poder incumbente e o mercado financeiro, que queria livrar-se do controle que lhe fora imposto nos anos 30 do século passado (exatamente por ter causado a crise de 1929).
Deram-lhe um suposto apoio científico. Papel coadjuvante, mas importante para a aceitação, pela sociedade desprevenida, da ideologia (vendida como ciência) que a desabrida liberdade das "inovações" do mercado financeiro e sua internacionalização eram fatores decisivos para o aumento da produtividade da economia real e para o desenvolvimento econômico dos países.
Hoje, os americanos parecem ter clara consciência de quem é a "culpa" pela tragédia que estão vivendo. Um levantamento da Gallup (15/16 outubro) mostrou que 2/3 das pessoas consultadas a atribuem ao governo federal e 1/3 às instituições financeiras. Mas o fato ainda mais grave (e que coloca em risco a reeleição do presidente Obama) é que a "qualidade" do programa posto em prática pelo governo de Washington para enfrentar a crise é considerada lamentável: mais de um US$ 1 trilhão de estímulos e quase quatro anos depois, o crescimento é pífio e o desemprego altíssimo. O verdadeiro conhecimento empírico e teórico da economia poderia ter sido melhor utilizado na formulação do programa, como mostraram em interessante artigo J.F.Cogan e J.B.Taylor ("Where Did the Stimulus Go?").
O US$ 1 trilhão de estímulo foi dividido em três programas de inspiração keynesiana-hidráulica: 1) colocar dinheiro diretamente nas mãos dos cidadãos (cheques do Tesouro) para que eles o gastassem em consumo (US$ 152 bilhões); 2) disponibilizar recursos para compras governamentais e infraestrutura (US$ 862 bilhões); e 3) transferir verba para Estados e governos locais, na esperança que ampliassem seus gastos com bens e serviços (US$ 173 bilhões).
Como se deveria esperar, em razão de experiências anteriores e desenvolvimentos teóricos, eles não produziram qualquer efeito "multiplicativo" importante, ao contrário do que haviam previsto os assessores econômicos de Bush e Obama.
A ineficiência do primeiro estímulo é consequência das pesquisas de Milton Friedman e Franco Modigliani, que mostraram que o consumo está ligado à renda "permanente" e não a um estímulo ocasional, frequentemente utilizado para "diminuir as dívidas" dos agentes, que foi o que aconteceu.
Quanto ao segundo, devido às dificuldades operacionais que sempre acompanham aumentos inusitados de disponibilidade de recursos no serviço público (a falta de bons projetos e a indisposição da burocracia, elementos amplamente conhecidos e empiricamente constatados), não se gastou até o terceiro trimestre de 2010 mais do que 5% do estimado!
Quanto aos estímulos transferidos para Estados e governos locais, eles tiveram o mesmo destino dos enviados diretamente aos consumidores: foram basicamente utilizados na redução de dívidas. De fato, dos US$ 173 bilhões transferidos, 4/5 foram utilizados no pagamento de dívidas acumuladas, o que praticamente anulou o efeito físico do "multiplicador". Aqui, também, já havia evidência empírica (Ned Gramlich, 1979) mostrando a ineficiência desse tipo de programa.
Esses fatos mostram o quanto de "ilusão" estatística está envolvida no cálculo descuidado e ingênuo dos "multiplicadores" ditos "keynesianos", quando se esquece o próprio Keynes. Se na prevenção da crise e na sua construção podemos criticar o "mainstream", parece que lhe devemos um crédito na crítica do horrível projeto de recuperação de inspiração do "keynesianismo-hidráulico" que desperdiçou US$ 1 trilhão...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassi ... lfim-netto
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Re: A Crise Econômica Mundial
Decifra-me ou te devoro
Jose Serra
“Decifra-me ou te devoro”. Esse era o desafio da Esfinge de Tebas. Ela eliminava aqueles que se mostrassem incapazes de responder a um enigma: “Que criatura tem quatro pés de manhã, dois ao meio-dia e três à tarde?” Todos os que ensaiaram a resposta tinham sido estrangulados. Édipo acertou. “É o ser humano! Engatinha quando bebê, anda sobre dois pés quando adulto e recorre auma bengala na velhice”. A Grécia traz hoje um novo enigma. Existe uma “Esfinge de Tebas” simbólica a assombrar a União Européia. Quem der a resposta errada será estrangulado, como no mito.
“O fracasso da Grécia seria o fracasso de toda Europa. Não é possível deixá-la cair”. São palavras de Nicolas Sarkozy, presidente da França. A quebra de um país que representa menos 3% da economia européia pode empurrar a Eurolândia para uma depressão profunda e, mais do que isso, desorganizá-la. Como é possível?
A Grécia abusou do gasto público desde que aderiu ao euro. Seu déficit fiscal em 2009 superava os 15% do PIB; o déficit primário, os 10%! A dívida pública grega, que em 2009 chegava a 130% do PIB, cresceu ainda mais em razão da crise, chegando a 150% neste ano e, projetada, a 170% em 2012.
Pior, em vista de aumentos salariais além da produtividade e de inflação acima da média européia, o país perdeu 27% de competitividade em relação à região, sem ter, em razão da moeda comum, taxa de câmbio nominal para ajustar: seu déficit externo em conta corrente superou os 8% do PIB.
Mas os gregos não carregam toda a culpa. No fim de 2009, o país pediu ajuda ao FMI. O spread dos seus títulos em relação aos alemães era baixo: 2%. Naquele momento, a UE e o Banco Central Europeu foram contra a ajuda do FMI. Por quê? Razões corporativas do BCE, falta de descortino e excesso de oba-oba dos líderes europeus. Seis meses de discussões estéreis, com a economia grega rolando num tobogã, até que a necessidade do acordo se impôs, só que em muito piores condições.
Quando o FMI fez o empréstimo, o spread já era de 9%, e a deterioração da economia, galopante: o PIB, que já caíra 2% em 2009, declinou 4,5% em 2010; em 2011, menos 4%. Compôs-se o círculo vicioso: enfraquecimento do setor privado, aumento do desemprego, queda da receita tributária, pressão sobre o déficit… Como nas tragédias gregas, depois da excitação da vitória, que traz consigo a irresponsabilidade, aconteceu a reversão do destino.
Reestruturar a dívida grega, não bastaria, dado o tamanho do déficit fiscal. Daí também a imposição de um brutal ajuste, a fim de obter-se um superávit primário de 6% do PIB. Assim, em dois anos, o governo grego deveria reduzir seus gastos primários em cerca de 16% do PIB! Isso com atividade econômica em queda. Mais ainda, sem uma taxa de câmbio para desvalorizar, o enfrentamento do desequilíbrio externo exigiria ainda uma inflação menor do que a média européia, forte redução de custos e aumentos da produtividade.
Parte da reestruturação da dívida grega já se fez, mas o desconto do valor presente dos títulos em mãos privadas tem de passar dos 20% de hoje para mais de 60%. O precedente, os impasses, e a sensação de que se trata de um buraco sem fundo, já contaminaram as expectativas em relação a outros países, como Espanha e Itália, que detêm perto de um terço do PIB da união monetária. Note-se que boa parte dos créditos à Grécia e a esses países tem origem em bancos de países da UE. Do ponto de vista do mercado financeiro, a reestruturação abre o precedente para as demais economias em dificuldades, representando um caso exemplar de risco moral (moral hazard), além de ser financeiramente inviável, pois são economias muito maiores do que a grega.
No início da década passada, a Argentina, com situação parecida à da Grécia, declarou o default, desvalorizou sua moeda, recuperou o nível de emprego e obteve melhora nas suas contas correntes com o exterior, à custa de cortes de financiamento externo privado e da instabilidade de preços. Para a Grécia, esse caminho implicaria o abandono da moeda única e a hiperinflação a curto prazo, sem que dispusesse do boom de preços de commodities que tanto beneficiou a Argentina pós-calote. Deixaria escombros terríveis para a UE, que teria de convencer o mundo de que não haveria efeito-dominó.
Mas por que a UE não foi capaz de corrigir desequilíbrios localizados que, ao subsistirem, trazem perigo para todo o sistema? O problema é a rigidez provocada pela decisão política de criar uma moeda única no início dos anos noventa, forçando o caminho para a criação do que Churchill chamou de Estados Unidos da Europa. A nobre razão política chocou-se com a racionalidade econômica e a criação do euro resultou no maior erro de política econômica em escala internacional da segunda metade do século XX.
Moeda única exige uma economia nacional, com plena mobilidade de mão de obra e de capitais, o que não existe na Europa, onde tampouco há política comum de previdência e benefícios sociais. União monetária exige união fiscal, mas o orçamento da UE é de 1% do PIB, quando no Brasil ou nos Estados Unidos a União (governo federal) detém mais de 20% do PIB – instrumento poderoso de compensações econômicas e sociais.
É fácil também compreender que, não existindo um Tesouro Nacional Europeu, nem um BCE que seja emprestador de última instância, a elasticidade da insegurança de credores dos governos e do setor privado da UE seja altíssima diante de situações de maior incerteza.
A União Européia, que engatinhou durante tanto tempo, de forma promissora, já está de bengala. O abandono do euro pioraria as condições econômicas de todos e representaria um retrocesso político de consequências incalculáveis, numa região que fez duas guerras mundiais só no século passado. Mas manter o euro, e fazer a economia navegar de forma mais segura, exige saltos políticos bem maiores dos que parecem exequíveis a curto e médio prazos. Eis um impasse que, à moda dos enigmas de Tebas, pode devorar a Europa.
http://www.estadao.com.br/noticias/gera ... 1021,0.htm
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Re: A Crise Econômica Mundial
Aí é que você se engana, Compson. Calote é calote, unilateral ou negociado. Tem sempre suas consequências. Um investidor livre não vai se arriscar a comprar papéis da Itália ou Espanha depois do calote negociado grego. E se esses países também vierem com propostas semelhantes? É por isso que depois do anúncio do plano europeu que incluiu o calote negociado grego, a Itália fez um leilão de bonds e viu as taxas exigidas pelo mercado subirem ainda mais. A 6% ao ano, com um crescimento econômico que tem ficado em torno de 0.5%, a situação projetada para daqui a alguns poucos anos vai ficando inviável.Compson escreveu:As medidas, se implementadas, resolvem o problema específico da Grécia... Serviram para evitar que um país do bloco desse um calote unilateral, o que imediatamente levaria à disparada dos juros dos outros países problemáticos, especialmente Espanha e Itália.Hammermart escreveu:Essas medidas da semana passada não resolvem nada, pelo contrário.
Um calote negociado de 50% da dívida grega não é algo que possa ser estendido para países como Espanha e Itália, só a Itália tem mais de $ 2,6 trilhões em dívidas. Se defaultasse em 50% também, o tal Fundo Europeu que se pretende alavancar para atingir $ 1 trilhão não daria para recapitalizar os bancos que levassem o calote italiano. A Espanha é ainda pior, com um desemprego de 21%.
Só trouxas estão comprando ações de bancos europeus, parte é porque estavam vendidos e tiveram de cobrir posições, mas logo esse movimento acaba e as ações de bancos vão sobrar na mão de uns desavisados.
O Fundo de Estabilização não tem o objetivo de compensar calotes de Espanha e Itália, mas evitar que eles aconteçam, mantendo seus juros baixos. Nenhum outro país vive uma situação catastrófica como a Grécia, o que pode ocorrer é os juros subirem a ponto de suas dívidas se tornarem insustentáveis. O Fundo vai negociar títulos desses países para evitar isso. Se vai dar certo, não sei...
Mas com o problema da Grécia resolvido, a probabilidade de dar errado é menor.
Agora, o problema da Europa vai demorar pra ser resolvido e passa por uma união fiscal (o que significa que os países terão de abrir mão de parte de sua autonomia orçamentária) e pela redução dos desquilíbrios de produtividade entre o norte (a Alemanha) e o sul (o resto). Reduzir esse desequilíbrio significa basicamente reduzir o salário dos trabalhadores do sul (ou acabar com o euro e permitir que os países controlem suas taxas de câmbio). Tudo isso vai demorar muito e, até lá, os europeus vão capengar mesmo...
Por caminhos bastante erráticos, a saída para toda essa situação provavelmente passará por novos calotes negociados, perdas para os acionistas de bancos e talvez perdas parcias também para bondholders, absorção de perdas pelos países que abrigam esses bancos e monetização das perdas soberanas. Isso se os alemães não se revoltarem antes e deixarem o Euro, o que levaria toda a zona a desmantelar-se.
Já nos EUA a solução passa por um fechamento radical do país para o comércio exterior, o que pode provocar uma imensa crise na China e mesmo no Brasil. Se insistirem na saída pela monetização, os QEs, vão sim enfrentar uma inflação fora de controle daqui a algum tempo. Isso não aconteceu ainda porque os QEs até agora foram de relativamente pequena expressão monetária, face à profundidade da recessão enfrentada. E também porque os QEs dirigiram o dinheiro criado para o sistema financeiro de forma concentrada, apenas gerando bolhas em certos mercados de ativos e não melhorando em quase nada as condições econômicas para a maioria da população.
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Re: A Crise Econômica Mundial
Que há consequências há... Mas é melhor uma saída organizada e razoavelmente consentida do que um calotão unilateral.Hammermart escreveu:Aí é que você se engana, Compson. Calote é calote, unilateral ou negociado. Tem sempre suas consequências. Um investidor livre não vai se arriscar a comprar papéis da Itália ou Espanha depois do calote negociado grego. E se esses países também vierem com propostas semelhantes?
Itália e Espanha não vão fazer a mesma coisa por dois motivos: (1) é impossível, já que um "haircut" de 50% de suas dívidas quebraria todos os bancos europeus; e (2) é desnecessário, pois suas dívidas não são insustentáveis, mas estão no limite da sustentabilidade dependendo do andamento das taxas de juros. O objetivo agora deveria ser evitar uma disparada nos juros desses países, e é para isso que foi criado o fundo europeu.
Deveria, pois a Grécia inventou esse referendo e é bem provável que eles rejeitem o acordo, apostando que a ajuda virá mesmo sem medidas de austeridade, já que não há muita alternativa para o euro.
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Re: A Crise Econômica Mundial
É, mas para "evitar uma disparada nos juros desses países" precisa primeiro combinar com o adversário... Se o Fundo Europeu vai se meter a comprar papéis de Itália e Espanha a taxas menores que as do mercado livre, quem é que vai prover o "funding" para o Fundo a taxas baixas? Não tem tanto trouxa vivo no mercado financeiro...Compson escreveu:Que há consequências há... Mas é melhor uma saída organizada e razoavelmente consentida do que um calotão unilateral.Hammermart escreveu:Aí é que você se engana, Compson. Calote é calote, unilateral ou negociado. Tem sempre suas consequências. Um investidor livre não vai se arriscar a comprar papéis da Itália ou Espanha depois do calote negociado grego. E se esses países também vierem com propostas semelhantes?
Itália e Espanha não vão fazer a mesma coisa por dois motivos: (1) é impossível, já que um "haircut" de 50% de suas dívidas quebraria todos os bancos europeus; e (2) é desnecessário, pois suas dívidas não são insustentáveis, mas estão no limite da sustentabilidade dependendo do andamento das taxas de juros. O objetivo agora deveria ser evitar uma disparada nos juros desses países, e é para isso que foi criado o fundo europeu.
Deveria, pois a Grécia inventou esse referendo e é bem provável que eles rejeitem o acordo, apostando que a ajuda virá mesmo sem medidas de austeridade, já que não há muita alternativa para o euro.
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Re: A Crise Econômica Mundial
Essa é a pergunta de 2 trilhões de euros. E é outro problema também...Hammermart escreveu:Se o Fundo Europeu vai se meter a comprar papéis de Itália e Espanha a taxas menores que as do mercado livre, quem é que vai prover o "funding" para o Fundo a taxas baixas?
O fundo já tem lá os seus 440 bilhões aprovados... É uma quantia pequena em relação ao tamanho do problema, mas não é insignificante.
A proposta é alavancá-lo até 2 tri. Se for colocando títulos, é de se esperar que a taxa desse fundo seja menor que as de Espanha e Itália, já que, em última análise, o fundo é garantido pela Alemanha. Aí se criaria uma margem pro fundo atuar. Os europeus esperavam que os "emergentes" ajudassem na alavancagem, mas estes não estão nada propensos a isso, no que fazem muito bem dado o histórico de filhadaputagem europeu com relação a empréstimos internacionais. Mas investidor vai ter, resta saber a quais juros...
Tem uma ideia mais complicada que é, em caso de calote, o fundo cobrir a "primeira perda" (first loss) de 20%, o que reduziria o valor esperado do calote e, portanto, os juros. Assim, o efeito da existência fundo sobre os juros seria multiplicado por 5, equivalendo a um fundo de 2 tri, sem alavancagem.
A segunda ideia é mais complexa, mas tem uma execução mais simples.
Mas se a Grécia não colaborar, volta tudo à estaca zero.
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Re: A Crise Econômica Mundial
Parece que a China está disposta a dar uma ajuda para a Europa:
China pode ajudar Europa em até US$ 100 bilhões, diz BC chinês
Segundo consultor do PBOC, em troca, 'não seria irracional solicitar ao menos um pouco mais de compreensão sobre os interesses chineses'
Danielle Chaves, da Agência Estado
PARIS - A China pode oferecer apoio para a zona do euro em um total de US$ 100 bilhões, afirmou Li Daokui, consultor do Banco do Povo da China (PBOC, banco central do país) e diretor do Centro para a China na Economia Mundial (CCWE, na sigla em inglês), segundo o jornal francês Le Figaro. "A China está pronta para ajudar a Europa", disse Li, acrescentando que duas condições precisam ser atendidas.
"A primeira é ter certeza de que a Linha de Estabilidade Financeira Europeia (EFSF, na sigla em inglês) será efetiva em ajudar a estabilizar a situação", explicou. A segunda seria a União Europeia oferecer uma série de garantias, afirmou Li ao jornal.
Se essas condições forem atendidas, "uma soma de cerca de US$ 100 bilhões não é inconcebível", disse Li. Perguntado sobre se a China pediu algo em troca de seu apoio, o consultor afirmou que "não seria irracional solicitar ao menos um pouco mais de compreensão sobre os interesses chineses".
Os líderes dos países do G-20, que inclui a China, estão reunidos em Cannes, na França, para discutir a crise de dívida da zona do euro, entre outros assuntos. Os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) realizaram pela manhã, às 6 horas (de Brasília), um encontro para discutir a ajuda dos emergentes à Europa. A reunião ocorreu antes do início do encontro do G-20.
Grécia
A China apoia os esforços da União Europeia para resolver a crise da dívida na região e está adotando uma ação prática para sustentar os países da UE, incluindo a Grécia, afirmou vice-ministro do Comércio da China, Zhong Shan, num comunicado publicado no site do Ministério do Comércio.
A China aumentará a cooperação marítima com a Grécia, o apoio a companhias chinesas que estão participando em projetos gregos de infraestrutura de construção e de privatização. O governo chinês também elevará as importações da Grécia e planeja atingir um comércio bilateral com o país de US$ 8 bilhões até 2015, disse Zhong.
Segundo o ministro, o funcionário do Partido Comunista Jia Qinglin disse, durante uma viagem à Europa, que a China está confiante que a União Europeia poderá resolver a crise. A viagem de Jia incluiu paradas na Grécia, Holanda e Alemanha.
As informações são da Dow Jones.
http://economia.estadao.com.br/noticias ... 0787,0.htm
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Re: A Crise Econômica Mundial
Acho que a ideia do referendo foi uma boa afinal: a Grécia vai negar o pacote, dar um calote geral, cair fora do euro e ressuscitar seu dracminha pra poder fazer política monetária.
No meio de 2012 os gregos vão tomar sol muito mais felizes que seus colegas europeus...
E tem gente que acha que política monetária não é importante!
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Re: A Crise Econômica Mundial
Uma péssima notícia para o Hammermart: foi-se o último dos inflacionófobos!
BCE baixa taxa de juro para 1,25%
http://www.agenciafinanceira.iol.pt/din ... -3851.html
BCE baixa taxa de juro para 1,25%
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Re: A Crise Econômica Mundial
É que a Europa ainda não decidiu ir com força pelo caminho da monetização, ainda está tentando dividir o sacrifício do resgate dos bancos com créditos soberanos entre os países europeus mais fortes e os próprios bancos.Compson escreveu:Uma péssima notícia para o Hammermart: foi-se o último dos inflacionófobos!
BCE baixa taxa de juro para 1,25%
http://www.agenciafinanceira.iol.pt/din ... -3851.html
A inflação pode sim sair do controle se partirem para uma monetização em grande escala.
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Re: A Crise Econômica Mundial
http://diplomatique.uol.com.br/editoria ... e13f8a4fac
A Espiral da Insensatez
por Silvio Caccia Bava
Agora não é mais uma bolha que explode. É uma crise sistêmica e planetária do modelo de capitalismo financeirizado que domina o mundo. Ninguém escapa dela.
Tal como grandes animais predadores, as grandes corporações financeiras internacionais estão devastando o tecido social europeu, criando uma zona de crescente instabilidade política e colocando em risco a economia global, mas também estão criando espaços para sua contestação.
Desde meados dos anos 1980 essas grandes corporações financeiras internacionais se fortalecem. Hoje elas controlam os governos e os organismos multilaterais, como o FMI, o Banco Mundial e o Banco Central Europeu. Isso ficou claro na crise de 2007/2008, quando um grupo dos mais importantes executivos, reunido com o FMI, impôs aos governos nacionais que se endividassem para salvar os grandes bancos privados. E os governos se endividaram muito além de sua capacidade.
Esse endividamento golpeou o governo da Irlanda, da Grécia, de Portugal, da Espanha e da Itália, e coloca sob ameaça mesmo a França e a Inglaterra. E para salvar esses países do default(calote) da dívida pública, novos pacotes de volumosos empréstimos foram mobilizados, com uma importante participação das grandes corporações financeiras internacionais, que viram nessas operações, com taxas de juros recordes, a possibilidade de grandes ganhos.
A crise, no entanto, recrudesce. A receita amarga das brutais políticas nacionais de ajuste, isto é, os cortes no orçamento público, nos salários, nas aposentadorias e nas políticas sociais não são suficientes para que esses governos paguem o que devem. E assim vai se desenhando uma espiral descendente cujo horizonte é mais recessão.
Quando esses grandes bancos privados perceberam o novo risco de defaulte viram o valor de suas ações despencar, mobilizaram outra vez os governos e a União Europeia, para garantir não só processos de recapitalização, mas também seus investimentos em bônus do tesouro de vários países. Numa conjuntura tão delicada, os conflitos de interesses no seio da União Europeia estão impedindo até o momento políticas regionais articuladas de enfrentamento da crise. Esse imobilismo faz que os riscos de desastre cresçam.
O que está em questão é o poder dessas grandes corporações financeiras internacionais. Se elas continuarem governando o mundo, a crise só se aprofundará. Abre-se então um novo campo de debate. Como superar essa crise?
O que era inimaginável poucos anos atrás está sendo discutido como uma das opções: a estatização do sistema financeiro privado − algo que a Índia já fez há mais de dez anos.
Aliás, vale lembrar que tanto a Índia como o Brasil (que tem 48% de seu sistema financeiro nas mãos de bancos públicos), pela importância do sistema financeiro público, puderam tomar medidas coordenadas de políticas anticíclicas e assim reduzir o impacto da crise de 2007/2008 sobre sua economia e sociedade.
Uma alternativa em discussão é a proibição da operação com derivativos: trata-se de impedir o sistema financeiro de especular e operar sem o necessário lastro de riqueza. Mas essa é uma política que necessita de coordenação internacional, e os atuais organismos de regulação internacional estão capturados pelos donos do poder.
Também volta como proposta a auditoria das dívidas públicas, as contraídas pelos governos. Experiências recentes, como a do Equador, resultaram em substancial redução de seu valor.
Os novos movimentos sociais impulsionados pela juventude na Espanha, na Grécia e no Chile vão além. Eles também querem a estatização dos bancos privados, mas trazem outras propostas: o fim das heranças e o salário-base de 30 mil euros anuais para todos, empregados e desempregados. No Chile, os estudantes não estão interessados em negociar com o Congresso; querem um plebiscito para definir que educação não pode ser objeto de lucro. Tem de ser pública, universal, gratuita e de qualidade.
Enquanto essas propostas ainda não ganham corpo, os grandes bancos buscam criar soluções para garantir sua própria sobrevivência. Para eles, trata-se de corrigir falhas do sistema, não de questioná-lo.
As propostas vão desde o patético apelo do bilionário Warren Buffet − de que os ricos precisam pagar mais impostos, com o que as grandes corporações discordam plenamente, e o Tea Party, nos Estados Unidos, está igualmente em radical discordância − até a versão da Taxa Tobin para os ricos, uma taxa sobre as transações financeiras, cujos recursos seriam destinados a um fundo europeu de estabilização para a recapitalização de bancos em dificuldades.
É da natureza do bicho. As grandes corporações não olham para o interesse público; elas têm como objetivo o máximo lucro. E, se os governos não foram capazes de impor essa dimensão de regulação pública à sua atuação, é porque foram capturados por ela. Isso compromete o sistema político e a democracia.
Os governos, com as políticas de ajuste, passaram a estar contra as maiorias. E, se o sistema político está controlado, sem condições de ser a arena pública da disputa e dos conflitos, da negociação, então as tensões ganham as ruas. A crise sistêmica é também a crise do sistema político.
Silvio Caccia Bava é editor de Le Monde Diplomatique Brasil e coordenador geral do Instituto Pólis.
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